sábado, 31 de agosto de 2013

O DEUS EXILADO: BREVE HISTÓRIA DE UMA HERESIA

Um pouco mais sobre a comunidade de seguidores de João Batista (mandeanos ou sabeus) pode ser encontrado no livro "O Deus exilado: breve história de uma heresia", escrito pela historiadora da USP, Marília Fiorillo. Também vale conferir uma entrevista concedida pela autora ao programa Millenium - Globo News. 


sexta-feira, 30 de agosto de 2013

JOÃO BATISTA E OS MANDEANOS NO "THE BIBLE AND INTERPRETATION"

Aos interessados no cristianismo primitivo, gnosticismo e movimentos sectários do primeiro século, vale conferir o artigo escrito por James F. McGrath no The Bible and Interpretation (ago/2013): "Revisitando o mandeísmo e o Novo Testamento". 

Os mandeanos (de mandeu=conhecimento, citados no Corão como sabianos) constituem um grupo religioso formado - ao que parece - por herdeiros dos antigos seguidores de João Batista. Reverenciam o Batista como o grande profeta e rejeitam Jesus, tido como usurpador do movimento legítimo. Grupos de mandeanos podem ser encontrados em algumas regiões do Irã e do Iraque.  


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

PROVOCAÇÕES

Aos católicos:
Ortodoxia é a heresia dos que venceram.
Heresia é uma ortodoxia que capitulou.
Dulia é latria de máscara e salto alto.  

Aos místicos
Deus é tudo e é nada.
É luz e é treva.
É dor, é prazer?

Aos reformados:
Predestinação é a doutrina dos eleitos.
Galardão, prêmio celeste aos que não merecem.
Réprobos são sempre os outros.

Aos fundamentalistas:
A Escritura é a palavra de Deus.
É Deus em palavras.
É o divino reduzido à letra.

Aos ateus:
Ateísmo é a fé no não-Deus. 
É a fé na negação.
Afirmação de uma piedade ao avesso.

A você:
Belo é o canto do Uirapuru.
Doces são os lábios da donzela.
Impiedosos são os laços do sheol.



Jones F. Mendonça

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

A MÁSCARA DO PALHAÇO

Lá vai João, perdido em sonhos sob a tenda encantada.
Lá vai Funâmbulo, caminhando faceiro sobre o fio estendido.
Lá vai Faquista, dispensando setas com muita atenção.
Lá vai Palhaço, rindo aos montes da sua própria desgraça.

Querer sonhar,
Querer enfrentar,
Querer superar.
Querer disfarçar as dores e ocultar as mazelas com a face enfeitada.

Pobre Palhaço!


Jones F. Mendonça

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

GADARA, GERASA, OS PORCOS E A LEGIO FRETENSIS

LXF=Legio X Fretensis
Evangelho de Marcos, capítulo 5, verso 1: Jesus atravessa o Mar da Galileia e chega à terra dos gerasenos (Gerasa). Mateus, capítulo 8, verso 28: Jesus navega pelo Mar da Galileia e desembarca na terra dos gadarenos (Gadara). Mas Gerasa (Marcos= 50Km a sudeste do Mar da Galileia) e Gadara (Mateus= a 12Km do mesmo lago) são cidades diferentes. Ambas são citadas por Plínio como pertencendo a uma liga de dez cidades romanas (Decápolis) fundadas em 64 a.C.

Diante da dificuldade quanto à distância que teria que ser percorrida pelos dois mil porcos até se precipitarem no mar, surgiram várias soluções: a) Orígenes sugeriu a cidade de Gersesa (sem nenhum fundamento), b) porcos endemoniados têm força sobrenatural (!), c) pouco importa, pois o relato não possui caráter histórico, mas consiste numa espécie de midrash do capítulo 14 do Êxodo (a exegese rabínica via sentidos velados no texto da Tanak). Quanto a esta última posição, vale comparar Êxodo com Marcos:
Ex 14,28 As águas, tornando, cobriram os carros e os cavaleiros, todo o exército de Faraó, que atrás deles havia entrado no mar; não ficou nem sequer um deles.


Mc 5,13 Saindo, então, os espíritos imundos, entraram nos porcos; e precipitou-se a manada, que era de uns dois mil, pelo despenhadeiro no mar, onde todos se afogaram.
O paralelo seria o seguinte: no Êxodo as tropas de Faraó foram destruídas pelo mar sob a liderança de Moisés. Marcos estaria insinuando que tropas romanas (legião) também seriam destruídas pelas águas, agora sob a liderança de Jesus (na parousia?), entendido como uma espécie de Messias político. A tese parece ganhar força quando vem à tona um importante detalhe: A Legio fretensis (legião romana), cujo símbolo era um javali (porco selvagem), estava situada na Síria desde o ano 6 d.C. (também usavam o javali como símbolo a Legio I Italica; XX Valeria-Vitrix e II Adiuntrix). Com a revolta judaica em Jerusalém na década de 60 d.C. a legião foi deslocada da Síria para a capital religiosa dos judeus (participou do cerco/destruição e passou a vigiar suas ruínas da cidade).

Caso esta seja a interpretação correta, a passagem jamais deveria ser utilizada para legitimizar atividades missionárias em terras estrangeiras, como geralmente se faz (tanto Gadara como Gerasa são cidades gentílicas e Jesus teria operado milagres em alguma delas). O texto seria uma crítica à ocupação das tropas romanas, instaladas no local desde 63 a.C. sob a liderança de Pompeu. Mas mesmo que esta última interpretação seja tomada como certa, fica a pergunta: por que Marcos escolheu uma cidade tão longe do mar da Galileia (Mt parece querer aproximar)? Mesmo que o relato não seja histórico seria de se esperar certa preocupação com os aspectos geográficos da região. Ou o autor do segundo Evangelho não conhecia bem a região da Galileia? 

O tema merece uma investigação melhor.


Jones F. Mendonça

Em tempo: Flávio Souza Cruz, do Ad Cummulus, acabou lendo meu texto e sugeriu uma resposta ao problema da distância entre Gadara/Gerasa ao "mar". Estou convencido de que ele matou a charada. Leia aqui um texto seu escrito em 2008. 

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

TEMPLOS, RITUAL E SIMBOLISMO CÓSMICO NO MUNDO ANTIGO [E-BOOK GRÁTIS]

Acabo de saber pelo Paleobable que o Instituto Oriental da Universidade da Chicago está disponibilizando gratuitamente o livro: "Heaven on Earth: Temples, Ritual, and Cosmic Symbolism in the Ancient World", editado por Deena Ragavan. O livro é ricamente ilustrado. 

Baixe aqui (clique na seta ao lado de "termos de uso"). 

Mais livros grátis no site aqui e aqui  


Jones F. Mendonça

LUTERO: “O DIABO É O DIABO DE DEUS”

Na perspectiva cristã há três personagens no Éden: Deus, o diabo e o ser humano. O humanismo eleva o homem. O dualismo maniqueísta eleva o diabo. A Reforma eleva Deus. É preciso estar atento: quando qualquer um dos três cresce, uma sombra cresce junto.

Se atribuirmos a Deus absoluta soberania (tudo o que ocorre é um desdobramento de seus decretos infalíveis) e o status de sumo bem (nele não há mal algum), o que resta ao diabo e ao humano?

Ora, se em Deus não há mal algum (não possui natureza dual), é preciso colocá-lo na conta do diabo. Mas Deus não é absolutamente soberano? Como o diabo poderia agir fora de seus decretos? Os reformadores admitem uma antinomia: tanto o diabo como o homem agem de acordo com Seus decretos, todavia são responsáveis pelo mal que praticam.

Com tal solução o diabo torna-se “o diabo de Deus” (frase de Lutero), uma espécie de “capitão-do-mato” dos céus. O homem torna-se um mero ser cuja vontade é “como um jumento, montada ou por Deus ou pelo diabo” (outra frase do reformador alemão). Deus usa o diabo para uma "obra alheia” (opus alienum), mas que ao mesmo tempo é sua “obra própria” (opus proprium). Confuso? Voltemos ao Éden.

Enquanto passeavam pelo jardim, homem e mulher cometeram uma infração. Mas a queda, segundo Calvino, já havia sido decretada por Deus. O diabo, travestido de serpente falante, foi um instrumento divino para que este propósito fosse cumprido. Deus é a mão, o diabo a lança, o homem a carne ferida.

A ferida infecciona. Calvino dispara: culpa do homem! Até há remédio, ele diz, mas só para os eleitos.


Jones F. Mendonça

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

SEJA BÍBLICO, SEJA TRADIÇÃO![?]

Dica para encontrar o verdadeiro sentido das Escrituras segundo um escritor cristão: compare as versões e seja bíblico! Hummm, será?

O primeiro problema está na comparação entre as versões. Ora, comparar versões em busca da melhor tradução é como buscar a mais fiel reprodução artística de um rosto por meio da comparação entre as telas. O mais óbvio não seria comparar as reproduções com o rosto real? No caso do texto, seria preciso conhecer o “rosto original” (texto original, o autógrafo). Vale lembrar que neste caso não existe um “rosto original”, mas “cópias embaçadas do rosto original”. Tal tarefa, como se vê, é bem mais árdua.

O segundo problema está no imperativo “seja bíblico”. Ora, se o que o leitor está buscando é exatamente o sentido do texto bíblico, como ele poderá assumir uma postura bíblica antes mesmo de ter acesso ao texto?  Um argumento circular ingênuo. 

Os católicos ao menos são honestos. Sabem (e admitem) que no final das contas quem manda é a tradição. 


Jones F. Mendonça

sábado, 10 de agosto de 2013

DÉFENSEUR DU TEMPS




"O Defensor do Tempo", fantástico relógio autômato criado pelo artista Jacques Monestier em 1979. Infelizmente está parado por falta de manutenção. Mais informações aqui.


Jones F. Mendonça

terça-feira, 6 de agosto de 2013

ECCE HOMO

Homo sapiens que pensa, reflete, arrazoa. Animal que se distingue dos demais. Fala, expõe ideias, transmite cultura. Face inversa do homo demens da guerra, da barbárie, da crueldade e da cegueira. Homem, tumulto ambulante hospedando uma luta incessante entre racionalidade e a demência.

Homo ludens, que com seus brinquedos se diverte, expõe os dentes, ri. Histrião que articula a realidade com a fantasia. Que se lança ao jogo que fascina, que alegra, que faz esquecer as desilusões.  Dimensão humana que contempla o júbilo, a criatividade e a exultação, mas também transgressão, trapaça e ilusão. É homem em estado de festa, é homo festivus.

Homo faber, que com a ajuda do intelecto fabrica, constrói, manipula a natureza a seu favor por meio da técnica. Faz fogo, faz roda, faz anzol, faz choupana, faz livro, faz deuses, faz-se a si mesmo com seu espírito inventivo.

Homo viator, que caminha, peregrina, que é itinerante. Ser insaciável que explora o ar, a terra e o mar. Homem pleno de expectativas, que vê diante de si um futuro aberto, cheio de novidades e possibilidades. Pensa a respeito da vida e da morte, do finito e do infinito, do eterno e do fugaz. Quer ir mais longe (quer ir longe demais?). Que transcender...

Homo religiosus, cheio de fé, de ritos, de mitos, de esperanças. Homem que se curva diante do Mistério. Que geme em suas súplicas. Que se entorpece na cantoria. Que almeja o infinito. Que eleva os olhos para os céus em busca de redenção.

Homem, o que tu és e qual o teu destino?

Jones F. Mendonça


PS: As mulheres que me perdoem, mas na busca por uma melhor fluidez do texto vi-me forçado a empregar a palavra homem como sinônimo de humano. 


domingo, 4 de agosto de 2013

CAECA SOMNIA

Em 15 de junho de 1520 Lutero foi ameaçado de excomunhão. A bula Exsurge Domini condenou 41 de suas 95 teses. Como o monge agostiniano não se retratou, em 03 de janeiro de 1521, por meio da bula Decet Romanum Pontificem, o papa Leão X o excomungou. Lutero rebelou-se contra os “ungidos do Senhor”. Nascia a igreja protestante.

A grande ironia disso tudo? Pregadores televisivos, filhos bastardos da Reforma, me aparecem ameaçando fies que denunciam atos ilícitos cometidos por pastores, os novos “ungidos do Senhor”. E as ovelhas cegas, já sem pelo, totalmente tosquiadas pelos pastores pilantras, dizem amém!


Jones F. Mendonça